Pois é verdade, passaram oito anos, desde que iniciei este blog. Assiduamente, venho publicando os meus posts, não com a pontualidade do início, é certo. Mesmo assim, sempre seguindo a linha que optei e à qual estou directamente ligada – a literária. Vejo que continuo a ter os meus leitores, uns dias mais, outros menos, como é natural. Mas que nunca faltam, é uma verdade. Comentários, isso, é que não. Naturalmente, porque existe um ponto de convergência social e virtual, chamado Facebook, ao qual as pessoas aderiram massivamente. Numa concorrência e dinâmica que funciona em moldes bem diferentes daqueles que regem os blogues. Nestes é notória alguma distância, alguma frieza, entre os bloguistas e os comentadores, provavelmente porque quem comenta é quase sempre alguém desconhecido. Utilizam-se muito os pseudónimos, mesmo assinados com nome próprio, coisa que não acontece no Facebook. Quem comenta, tem a própria foto, que serve para identificação. Não há dúvida de que nesta rede social, acontece um convívio mais amplo e mais aberto entre todos, coisa que não se verifica num blogue. Nestes oito anos, muitos e bons blogues foram ficando pelo caminho, por uma razão ou por outra. Destaco quatro: GARATUJANDO (Carlos Ferreira); SETE VIDAS COMO OS GATOS (Rui Vasco Neto); FRUTOS DE MIM E MAR (Maria Isabel Fidalgo) e O ESPÓLIO (Daniel de Sá). O Sarrabal, vai continuando, enquanto achar que merece a pena – mesmo sem comentários! Grata aos que me lêem, porque me dão motivo para prosseguir. Faço votos para que, no próximo ano, nos voltemos a encontrar por aqui. Deixo-vos o meu agradecimento, e estas 8 velinhas a testemunhar que o tempo passa a correr.
Soledade Martinho Costa
OUTRO ANIVERSÁRIO - LEMBRAR AMÁLIA
Iniciei este blogue no dia 23 de Julho de 2007. Propositadamente, por ser o dia do aniversário do nascimento de Amália Rodrigues. Sempre a tenho lembrado. Mais uma vez o faço. E, mais uma vez, com a lembrança inesquecível de ter tido o privilégio da sua amizade e da sua presença - atenuada pela sua voz, intemporal, que nos legou como herança. RIP
S.M.C.
«Não me lembro do ano em que voltei à casa da minha avó. Nem vou voltar nunca mais, embora a casa continue lá. Quando voltei, tinham passado muitos anos, tinham emudecido todas as vozes. O silêncio, tão grande! Ao contrário do espaço, muito mais pequeno, revisitado agora com os meus olhos adultos. Mas lembro-me de todos os recantos da casa, de muitos objectos, dos móveis: do armário, muito antigo, de madeira avermelhada e polida, alto, quase a tocar o tecto, com duas largas portas envidraçadas. Pertencia à minha tia Maria Eduarda. E eu a pedir, sempre que ia de visita a casa da avó Maria Estrela: –Tia Maria Eduarda, posso ir ao armário? E a minha tia, a sorrir, a dizer-me logo que sim, mas a avisar: – Olha que não tenho lá nada de jeito, filha! Mas tinha. Tinha sempre: um pedacinho de bolo, um frasquinho de mel, um naco de marmelada, doce de tomate, uns biscoitos. E eu, que não era gulosa, a saber-me tão bem comer um bocadinho de qualquer coisa que a tia guardasse. Havia outro louceiro (naquela altura chamado «aparador»), o da tia Bé, despido de qualquer gulodice. Menos antigo, mas também com diversos encantos para mim: um aquário que nunca viu sequer um peixe, colocado sobre a pedra mármore, com duas aves de asas abertas, pousadas no rebordo de vidro, e um arlequim de loiça vestido de preto e branco a tocar um harmónio. Na parte de cima, chávenas de chá muito ordenadas na sua fila, penduradas nos grampos, a estremecerem quando o soalho, ao peso dos passos ou das nossas correrias de criança, as fazia baloiçar, levemente, num pendular gracioso, ao som do tilintar dos copos – que não eram de cristal. Em baixo, as duas portas onde o meu tio Zé guardava alguns livros e revistas, principalmente as revistas do tempo da guerra, a mostrar ao nosso olhar da infância (sempre que, por descuido, as portas ficavam abertas) os horrores dessa época, imagens de homens, mulheres, crianças, soldados, aviões em chamas – aviões em chamas que, passados tantos anos, guardo ainda na memória dos meus olhos. E o cheiro da tinta dessas revistas. […] E as janelas, tantas janelas na casa! […] Noutras dependências, muitas, muitas outras coisas, de que me recordo. De que me vou recordar sempre. Porque será que a infância e o que a ela está ligado nunca se separam de nós? Quanto mais o tempo passa, mais se vive do passado. Isto é, quanto mais envelhecemos, mais nos aproximamos da infância, dessa infância que se agarra à nossa pele, aos nossos olhos, ao nosso coração. Muito mais os rostos e as vozes daqueles que já cá não estão, e nos amaram, nos fazem companhia, nos falam e nos escutam nas palavras que não dizemos.»
Soledade Martinho Costa
Do livro «Uma Estátua no Meu Coração»
«Neptuno e Anfitrite», Jacob de Cheyn
Talvez houvesse areia
E tu sorrisses
Talvez houvesse mar
Fosse uma praia
E um búzio sibilino
Anunciasse
Que te aguardavam ninfas e tritões.
Talvez houvesse vento
E tu partisses
Talvez houvesse lua
Fosse um espelho
E um hipocambo de oiro
Te levasse
Ao reino de Anfitrite e Neptuno.
Talvez houvesse esperança
E tu esperasses
Talvez houvesse ceptro
Fosse um trono
E Nereu te oferecesse um diadema
E com ele adornasse
Os teus cabelos.
Talvez houvesse paz
E tu dormisses
Talvez houvesse alguém
Fosse uma voz
E Tétis no seu peito
Te acolhesse
Como se fosses o filho de Peleu.
Talvez houvesse tempo
E tu pudesses
Talvez não fosse Inverno
Não chovesse
Não fosse noite
E medo
E punição.
Talvez não existisse
Um rouxinol
Cativo do seu canto
Nos teus pulsos.
Os vinte anos da tua solidão
Talvez tu próprio
Um dia
Mos contasses.
Talvez houvesse fome
Fosse amor
E o teu desejo tão-só
De que a matasses.
Soledade Martinho Costa
Do livro a publicar «Um Piano ao Fim da Tarde»
Vila Franca que te vestes
Sempre de verde e vermelho
Com meias de renda branca
Que te sobem ao joelho.
Na mão ergues um pampilho
Bem acima da montada
Para guiar um novilho
Que se afastou da manada.
Como enfeite tens o rio
E a Senhora de Alcamé
Tens o melão e as barcaças
A dormir ali ao pé.
Tens o «Colete Encarnado»
E a bela sardinha assada
Juntinhos na tradição
Que em ti encontrou morada.
Tens lezírias, tens touradas
As cheias calham-te em sorte
Tens na tua capelinha
O Senhor da Boa Morte.
Quando chega o mês de Outubro
Toureiros vestem-te de oiro
E tens as esperas do povo
A correr atrás do toiro.
Danças com garbo o fandango
Tens Soeiro e tens Redol
Tens o Tejo no Inverno
A servir-te de lençol.
Na alma tens os “Gaibéus”
No coração tens os “Esteiros”
E manténs a tradição
Nas redes dos avieiros.
Soledade Martinho Costa
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