Domingo, 25 de Novembro de 2007
É geralmente nos inícios de Novembro (por tempos mais recuados em Dezembro) que se procede à apanha da azeitona, a estender-se, por vezes, até ao mês de Janeiro.
Actividade ligada à extracção do azeite, de grande significado no que respeita à parte económica relacionada com o agregado familiar, apresenta-se nos dias actuais com menor relevância no âmbito das pequenas comunidades, devido aos poucos lagares ainda em condições de funcionamento e à redução do número das nossas oliveiras – a trazer à lembrança tempos de grandes olivais, de grande produção de azeite, de grande alegria (apesar do árduo trabalho), manifestada pelos antigos ranchos de «azeitoneiros» ou «apanhadores» de azeitona, chamados na Beira Litoral «branjadores» numa derivação popular da palavra «varejar» («barejar» no dizer local, isto é de «barejadores»).
Por lugarejos, aldeias e vilas continua a tratar-se do pouco que resta, pertença de passados bens, que as mãos e o conhecimento de quem sabe e os herdou teima em não deixar morrer, com alguma fé no futuro e (ainda) nas gerações futuras.
É nesses locais que Novembro acorda para realizar a tarefa feita como antigamente – sabendo-a, embora, simplificada por acção mecânica – a repetir ritos e trabalhos, confraternização e risos, nascidos das raízes da tradição de um tempo que não se apaga da memória das gentes.
Utilizando o varejão ou empoleirados nas escadas de muitos degraus, continuam os homens a varejar as oliveiras, enquanto as mulheres, curvadas sobre os panais, vão apanhando as azeitonas com que enchem os poceiros de plástico (a substituir os antigos cestos de verga), levados depois para os atrelados dos tractores (que os carros de bois transportavam por tempos idos).
Quando a safra é pequena, a azeitona colhida, apenas dá para a chamada «troca» feita no lagar, com as azeitonas medidas por poceiros (vasilhas de plástico), outrora na «fanga» (espécie de padiola conduzida por um ou dois homens), de modo a que o seu peso corresponda ao azeite recebido em troca.
Acima de doze poceiros (um «munho» ou «prensada») já o agricultor pode mandar fazer o seu próprio azeite: quantos mais «munhos» entregues no lagar, maior a quantidade de azeite recebido.
Conforme as regiões, a azeitona é verde ou preta, miúda ou grande, sendo as mais conhecidas a cordovil, a cordovesa, a bical, a picoal e a curançosa, entre as mais de cinquenta variedades existentes.
Após a sua entrega no lagar, as azeitonas são limpas de impurezas, lavadas e geralmente salgadas com sal grosso.
Depois disto, são depostas na «tulha», passando desta para as «galgas» ou «farneiro» (pedras das mós entre as quais é moída) e dali por uma tubagem accionada pelo «sem fim» para a «batedeira» ou «aquecedor» (depósito de forma cilíndrica), de modo a que a massa ou pasta da azeitona seja aquecida em temperatura média, graças à «serpentina» que transporta água quente e reveste o interior do depósito.
A massa cai depois num tabuleiro, sendo levada em «gamelas» ou numa pá até à prensa, onde a pasta da azeitona é espalhada em camadas, cada uma delas tapada com o «capacho» ou «seira» (de esparto ou sisal, de preferência ao material plastificado), para ser calcada e prensada.
Nesta operação podem ser utilizados entre quarenta a cinquenta «capachos», alternando com outras tantas camadas de azeitona, cada camada correspondendo, aproximadamente, a dez quilos de pasta de azeitona.
O líquido assim obtido corre da prensa para as pias ou talhas de pedra (designadas, antigamente, na Beira Litoral, por «tarefas»), tomando, a partir daí, o nome de «águas russas». A substância permanece nas pias entre três a quatro horas para efectuar-se a decantação, ou seja, para que o azeite venha ao de cima, enquanto as impurezas ou «almofeira» é escoada pelo «ladrão», uma abertura no fundo da pia, que a leva para um outro depósito, que não se encontra à vista.
As impurezas ou subproduto escoado e depositado no «ladrão» é utilizado em várias aplicações: rações para animais, óleos, sabões, etc.
Segue-se o «caldeamento», efectuado com a ajuda das «gravanadas» (regadores com um bico), isto é, junta-se ao azeite cerca de trinta litros de água fervente por pia, ao mesmo tempo que a mistura é mexida e «medida», utilizando-se para isso varas de marmeleiro. Sempre que possível, o azeite permanece nas pias durante vinte e quatro horas, até «assentar» e ser retirado já limpo.
Depois destas voltas, eis a riqueza do fruto transformado em azeite. Convertido no milagre do alimento e da luz. O ouro liquefeito no prato ou na candeia. Ou na lamparina que alumia o sono e também a vigília dos santos.
Soledade Martinho Costa
In “Festas e Tradições Portuguesas”, Vol.VIII
Ed. Círculo de Leitores
Terça-feira, 20 de Novembro de 2007
Não estava à espera (nem sabia da sua existência), mas o Sarrabal foi distinguido com o prémio «Simpatia/2007».
Agradeço, reconhecida, ao blogue Golfinho Alegre, na pessoa de Ricardo N., que o indigitou.
A distinção é acrescida das seguintes palavras (obrigatórias):
«Afinal, ser simpático, sorrir, ser amável e respeitar o próximo, não custa nada. E, já agora, ousem SER FELIZES.»
Soledade Martinho Costa
Segunda-feira, 19 de Novembro de 2007
Mais
Do que saber
Que os gestos matinais
Não se repetem
Na manhã de amanhã
Nem nas outras manhãs.
O abrir da porta
As palavras todas
O transportar na mão
O retiro
O ninho
Que abrigava o teu corpo
Tão sem peso
Tão sem mácula
Como semente
Que alimenta o coração.
O correr
O vidro da janela
Para oferecer-te
O ar
A luz
O Sol
Que te faziam procurar
A limpidez da água.
Mais
Do que saber
Um segredo
Enterrado num canteiro
Entre violetas
Sob o canto das cigarras.
Mais
Do que saber
Que as outras aves
Te fazem companhia.
Que os lagartos
Se vão esconder
Na tua sombra
E os camaleões
Tomam a cor da tristeza
Para matar a sede
Junto a ti.
O que mais dói
É o silêncio.
O silêncio do voo
Na liberdade da casa
A ausência do canto
A falta do espreguiçar das asas
A anunciar o sono.
O que mais dói
É esta mágoa
Esta saudade que se instalou
Na fatia do tempo.
Esta certeza
De não querer repetir o amor.
O canto azul das aves
Também morre.
Soledade Martinho Costa
(Julho/1996)
Sábado, 17 de Novembro de 2007
A música dos ralos
Onde fica?
Onde dormem as aves
Rios
Fontes?
Da palavra e do riso
Onde a malícia?
Atrás da cal dos muros
Jazem sombras
Lembram-lhe os nomes
As pedras e o musgo.
Que trevas ofuscaram as estrelas
Que neblina ocultou dos pés a ponte
De acesso à outra margem
Onde ardia
Num arrebol de luz
O horizonte?
Do alvor ao poente
Quanto dista?
Dos actos assumidos
Qual o juro?
Muralhas de silêncio
Ou grito aceso?
Longe
Longe no tempo
Estão os olhos
E um retrato
Colado nos ouvidos.
Soledade Martinho Costa
Do livro “15 Poemas do Sol e da Cal”
Ed. Editorial Presença
Sexta-feira, 16 de Novembro de 2007
Mocho Coruja
- Ora, boa noite, bons olhos o vejam! – diz a coruja para o mocho, seu companheiro e ave de rapina nocturna como ela. – Há muito que não aparece por estas bandas. Por onde tem andado, se não é segredo?
- Olhe, minha amiga, mudei de casa.
- Mudou de casa!? Não sabia! – espanta-se a coruja, num pio prolongado.
- Pois é verdade. – continua o mocho – O buraco onde vivia, no tronco de uma azinheira, começou a ser pequeno. Então, mudei-me para um outro maior, na fraga do monte.
- E fica longe? – interessa-se a coruja.
- Oh! amiga Coruja, essa pergunta nem parece sua! Para quem possui asas como nós, acha que a distância é coisa importante!?
- Claro, tem razão! – exclama a coruja embaraçada.
É a vez de o mocho perguntar:
- E por aqui, como vai a caça?
- Assim-assim. No Outono, é o costume. Os ratos do campo começaram a procurar refúgio nos currais e nos celeiros. Os arganazes escavam as galerias onde vão dormir um sono até chegar Abril. Os lagartos, agora mais friorentos, já aparecem pouco. Restam os insectos e os morcegos… – informa a coruja, que logo quer saber: - E lá pelos seus lados, compadre, há mais fartura?
- A mesma coisa. É o Outono, como a comadre disse – replica o mocho. – Eu bem adejo as asas sem fazer barulho; graças à leveza das minhas penas, sou tão silencioso que ninguém dá por mim. Mas estes meses, são meses ruins – acrescenta no seu piar sonoro e sempre triste.
- Lá isso, é verdade – pia a coruja, numa aprovação.
E seguem ambos, de ramo em ramo, num adejar feito de lendas e segredos. Ouvidos atentos, olhos a investigar a noite. Que tanto a coruja como o mocho têm boa visão, embora não suportem muito bem a luz do dia.
Soledade Martinho Costa
Do livro “Histórias que o Outono me Contou”
Ed. Publicações Europa-América
Terça-feira, 13 de Novembro de 2007
Há um silêncio de ave à nossa volta
A marcar a cadência aos nossos passos.
Faz-nos falta uma flor
Que os troncos mortos
São vontades ausentes
E a força
Que nos faz chorar de pena
Verdes copas.
Junto de nós
Nos olhos do menino sem jardim
Uma tristeza azul
Que nos importa.
E o peso de uma culpa
Que não temos
Carrega os nossos ombros
Mesmo assim.
Soledade Martinho Costa
Do livro “A Palavra Nua”
Ed. Vela Branca
Domingo, 11 de Novembro de 2007
Consagrado por tradição, à abertura nas adegas do vinho novo e da água-pé, o dia de São Martinho reveste-se, entre nós, país vinícola, de um simbolismo particular e ainda marcadamente pagão. Daí, dizer-se que as festas populares da abertura do vinho novo do mundo pagão grego-romano vieram a ter a sua réplica cristã nas festividades em louvor de São Martinho.
" Os borrachos ou o triunfo de Baco", Velasquez
Com efeito, por esta data realizavam-se em Roma em honra de Baco (na Grécia, Dioniso), deus do vinho na religião grega e romana, as Grandes Dionisíacas, as Leneias ou Festas dos Lagares e as Antestérias, na altura da prova do vinho novo. Com a mesma finalidade celebravam ainda os Romanos as Lundi Compitales e as Meditrinálias (embora não se conheçam referencias à deusa Mediatrina).
Pinhel, Guarda
Tanto as Grandes Dionisíacas como as Lundi Compitales integravam nas suas festividades autos populares dramáticos, representados na altura das vindimas – à semelhança dos autos ou dramas populares representados, outrora, nas nossas aldeias nesta mesma data. Em Portugal chegou mesmo a ser proibido «vender o vinho novo antes do São Martinho, sob pena de multa».
Antigos toneis de carvalho, Bucelas
Dia particularmente festivo, encontra-se associado ao ritual dos «magustos», que se realizam um pouco de norte a sul do País, com maior incidência no Minho, Trás-os-Montes, Beiras, Douro, Porto e Estremadura, reunindo à volta de fogueiras, em celebrações alimentares conjuntas, os apreciadores do vinho, da água-pé e das castanhas.
Marmelete, Algarve
A tradição, com início logo a partir do dia 1 de Novembro («Magustos dos Santos»), estende-se até ao dia 11 e mesmo após esta data, associada ao final das colheitas e à chegada do Inverno.
Castanheiro
Mas é em Trás-os-Montes – região de castanheiros – que a castanha se apresenta como alimento de eleição, quer nesta data, quer durante o ano inteiro, tendo chegado, por tempos idos e difíceis, a substituir o pão e a batata, sendo considerada, no século XVII, um dos produtos básicos da alimentação das populações beirãs.
Colhidas nos meses de Outubro e Novembro, comem-se cruas, fritas, assadas e cozidas, levando, neste caso, o nome de «castanhas mamotas». Para se conservarem são dispostas sobre ripas (os «caniços»), colocadas acima do lume das lareiras e mexidas de vez em quando, para apanharem todas elas a mesma corrente de ar quente e seco e o mesmo calor.
Geralmente, são retiradas no final de Dezembro, altura em que dão lugar aos enchidos da matança do porco, que passam a secar no fumeiro.
Chaves
Para melhor se conservarem é costume mantê-las nos «ouriços» (cascas), só as retirando quando se querem comer, dar ou vender.
No caso de serem piladas, as castanhas são introduzidas em cestos apropriados e pisadas (trabalho a cargo dos homens, calçados com botas bem ferradas, revestidas de pregos curtos de cabeça larga) até se soltarem da casca e saírem pelas ranhuras do respectivo cesto, com este a ser levantado e «esquivado» (abanado).
À semelhança das «desfolhadas» e das «espadeladas» (linho), a tarefa é efectuada por grupos de vizinhos, familiares e amigos, que se juntam, uns depilando, outros esquivando as castanhas, até estas ficarem libertas da casca e secarem, entretanto, com o passar do tempo.
É com a castanha pilada, depois de demolhada e cozida, que, na região de Pampilhosa (Beira Litoral) se acompanha o tradicional prato de cozido à portuguesa. Com ela prepara-se também o «caldudo» ou «caldelo», o mais famoso dos doces portugueses feitos com castanhas.
A partir dos anos vinte as castanhas começaram a escassear, principalmente na região da Beira Baixa, devido à «malina», ou «doença da tinta», que matou, desde aí, milhares de castanheiros no nosso País, embora a sua maior implantação se situe no Norte interior, na região de Entre Douro e Minho e no Nordeste Alentejano (onde dão aos «magustos» o nome de «castanhada»), com alguma relevância ainda na zona de Monchique (Algarve). Aqui, a castanha é também acompanhada com a tradicional aguardente de medronho e os «magustos» feitos, igualmente, com batata-doce (as «castanhas da terra»), assadas numa cova aberta no chão e tapada com terra sobre a qual se acende uma fogueira.
Batata doce
Mas é na região de Entre Douro e Minho que se tornam particularmente vivas e bastante comuns as festividades a São Martinho, com a caruma apanhada dias antes, para estar bem seca no dia do «magusto».
Marmelete
Depois, à roda das fogueiras, onde estalam as castanhas, o povo reúne-se, então, em alegre convívio para celebrar o santo e provar o vinho novo e a água-pé – num concelho que se estima como o maior produtor de vinho verde de Portugal.
Associadas aos «magustos» ou ao santo, vamos encontrar diversas praxes e rituais que não se perderam ainda totalmente entre nós, como sejam, entre outras, as «enfarruscadelas» entre os convivas, feitas com a cinza resultante da assadura das castanhas; a figuração de São Martinho, simbolizada num boneco vestido com roupas velhas, à qual se ateia fogo, após lido o testamento do santo; a divisão da «castanha-afilhada» (pegada a outra), repartida entre namorados, acompanhada com vinho ou água-pé bebidos do mesmo copo ou, ainda, quando são encontradas duas castanhas dentro da mesma casca, a oferta do «filho» (a castanha mais pequena) a quem se desejar, ficando ambas as pessoas «compadres» até ao São Martinho do ano seguinte.
A designação «martinhada» dada em certas localidades ao «magusto», faz lembrar que, na Idade Média, era no dia de São Martinho que se pagava a «martinhádega», imposto também chamado «martinega», isto é, a receita cobrada pelo senhor feudal em Novembro de cada ano – o mesmo acontecendo com o pagamento do foro ao rei e seus sucessores «em cada ano desde o dia de São João Baptista até ao dia de São Martinho».
Soledade Martinho Costa
In “Festas e Tradições Portuguesas”, Vol. VIII
Ed. Círculo de Leitores
Nasceu em Sabária da antiga Panóia (hoje Hungria) entre 315 e 317, filho de um oficial do exército romano. Estudou em Pavia, embora o pai, na intenção de afastá-lo das influências cristãs, o tenha inscrito no exército com a idade de quinze anos.
Seguindo a orientação da família, Martinho tinha por devoção os deuses que faziam parte da mitologia dos Romanos. Ainda assim, e de acordo com a lenda, numa manhã de Inverno, chuvosa e fria, perto de Amiens (França), indo ele a cavalo, viu um pobre quase nu que lhe pediu esmola. Como não tivesse consigo nada que pudesse socorrer o mendigo, servindo-se da sua espada, cortou ao meio a capa que levava sobre os ombros, para que o pobre pudesse agasalhar-se. Nessa altura, a chuva parou e o Sol rompeu por entre as nuvens a permitir o aquecimento da temperatura. Daí para cá, por esta data, a situação repete-se. Durante uns dias, parece que o bom tempo resolve voltar. É o chamado “Verão de São Martinho”, a fazer lembrar o lendário milagre.
Ainda de acordo com o mito, nessa noite Martinho sonhou com o mendigo que lhe dizia: “Eu sou Jesus e tu dividiste a tua capa comigo. Sempre que fizeres o bem aos mais necessitados, é a mim que o fazes”. Impressionado, Martinho começa a converter-se à Religião Cristã – por essa época já adoptada pelo imperador Constantino I, que permite o Catolicismo praticado livremente no Império, sendo, mais tarde, proclamado como a Religião do Estado.
Obrigado por lei ao juramento militar, que o obrigava a servir a Guarda Imperial até aos quarenta anos, mas consciente de que não poderia perseguir os seus irmãos na fé, resolve exilar-se. Certo das suas convicções religiosas, vai encontrar-se com Santo Hilário (bispo de Poitiers, França), tornando-se seu discípulo. Mais tarde (supõe-se que em Julho de 371), é por este ordenado e sagrado bispo de Tours (França).
Retirado a seu pedido, para um lugar isolado (Ligugé, perto de Poitiers), vive como um monge num local humilde, mas depressa reúne à sua volta discípulos atraídos pela sua fama de grande sabedoria e bondade. Ali, funda o Mosteiro de Lingugé e, mais tarde, junto da cidade de Tours, o de Marmontier, este com um Seminário. Opta, então, pela vida monástica, arrastando com ele outros crentes na nova religião. A sua fama espalha-se pelo Mundo, assim como as suas pregações. A sua simplicidade, bondade e despojamento, levam a que o considerem um santo. Apelidado de Apóstolo das Gálias, São Martinho ficou conhecido, particularmente, pela sua extrema caridade.
A sua vida dedicada à pregação induziu a que mandasse destruir templos dedicados aos deuses pagãos, a introduzir festas religiosas e cristãs e a defender a independência da Igreja do poder político. Atitudes nem sempre bem aceites, tendo sido, por vezes, repudiado e até maltratado. Morre em Candes (França) no dia 8 de Novembro de 397 com oitenta anos. O corpo chega à cidade francesa de Tours no dia 11 de Novembro, acompanhado por cerca de dois mil monges e muito povo devoto, sendo sepultado no cemitério à entrada da cidade.
Em 444 é-lhe dedicada uma capela, seguida, por volta de 458 ou 459 da edificação de uma basílica. Durante a Idade Média eram constantes as peregrinações ao seu túmulo, só comparáveis às que eram feitas aos sepulcros dos Apóstolos em Roma, tal a fama dos seus milagres. Ao longo dos séculos foi considerado o santo mais popular da Europa Ocidental. A crença em São Martinho era tanta que os Merovíngios (nome da primeira dinastia que reinou em França), antes de partirem para a guerra, rezavam junto do seu túmulo, levando as tropas, na dianteira, a capa do santo como talismã. Os seus atributos são um cavalo branco, uma espada e um manto. Iconograficamente, aparece galopando à frente dos exércitos.
Quanto à alegoria “Verão de São Martinho”, relaciona-se com o facto de se registarem, quase sempre no início de Novembro, alguns dias de temperatura amena e por vezes de calor. Por isso, diz o povo: “O Verão de São Martinho, é bom mas é curtinho”.
Não se lhe conhece, todavia, qualquer ligação ao vinho. Supostamente, a sua celebração resultará da apropriação ou réplica cristã, das festividades greco-romanas dedicadas a Baco, deus romano e grego do vinho, que tinham lugar em Roma e na Grécia por altura da abertura nas adegas do vinho novo (9 de Outubro). Nos países vinícolas do Sul da Europa, a data é celebrada com o vinho novo e a água-pé, estando o seu culto relacionado com a terra, as previsões do ano agrícola, festas, canções e rituais associados à abundância das colheitas.
Soledade Martinho Costa
In “Festas e Tradições Portuguesas”, Vol. VIII
Ed. Círculo de Leitores
Terça-feira, 6 de Novembro de 2007
Nas águas do regato
Foi torrente
Trovão que se acendeu
Em cama fria.
E por ter sido
Escravo de enfiteuses
Há-de acordar
Talvez
Lá no Olimpo
A convite de Baco
E outros deuses.
Soledade Martinho Costa
Do livro “O Nome dos Poemas
Domingo, 4 de Novembro de 2007
É hoje o dia dos teus anos
Debruço-me em teus braços
Dou-te um beijo
E nem calculas
Como sinto em mim desejo
De fazer-te esquecer
Os desenganos.
Mal desperto ainda do teu sono
Rabujas que há já rugas no teu rosto.
Deixá-lo
Porque sabes bem que gosto
Quando depois do Verão
Chega o Outono.
E vê
Repara bem na luz do dia
A envolver-nos assim
Nesta magia
A atravessar os vidros da janela.
Mais logo
Só terás no seu lugar
O declinar da tarde
E o luar
Quando o manto da noite
Entrar por ela.
Soledade Martinho Costa
Do livro “Reduto”