
Capela da Misericórdia
Perde-se nos tempos esta tradição litúrgica efectuada na aldeia do Ladoeiro (Idanha-a-Nova), embora se admita a hipótese de remontar ao ano de 1581, data da fundação da Misericórdia local.
Capela da Misericórdia.
O ritual religioso tem início na primeira sexta-feira da Quaresma, prolongando-se pelas seguintes, à excepção da sexta-feira anterior ao Domingo de Ramos. Pelas vinte e uma horas (outrora à meia-noite), os irmãos da Misericórdia, velhos e novos, dirigem-se à capela da Misericórdia, onde vão buscar a Cruz de Cristo. Dali, partem em cortejo, acompanhados pelo pároco, cada um levando na mão uma vela acesa – símbolo da Luz de Cristo.
Percorrem assim as ruas principais do lugar, encaminhando-se depois para a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Espectação, ao encontro dos irmãos da Confraria do Santíssimo Sacramento. O regresso à capela é feito em conjunto: os irmãos da Confraria à frente, os da Irmandade da Misericórdia seguindo atrás, vestidos com opas vermelhas.
Desde a saída e até o regresso ao ponto de partida (capela da Misericórdia), são rezados cinco «Mistérios», alusivos a outros tantos episódios da Paixão de Cristo. O padre caminha atrás da Cruz e do seu lado direito segue o provedor da Misericórdia. Tanto o tesoureiro como o secretário levam na mão uma vara «em alusão ao poder dos homens», dizem uns, «para aquietar, antigamente, os mais pequenos», dizem outros. Ainda hoje os rapazinhos acompanham os pais, alguns vestindo também opas vermelhas.
A procissão demora cerca de uma hora a percorrer a aldeia, sendo o itinerário em forma de círculo. E faça frio ou a noite seja de chuva, o cerimonial, por tradição, nunca deixa de cumprir-se.
As mulheres, a quem era, em anos recuados, proibido em absoluto participar na cerimónia, acompanham hoje, embora a certa distância, o ritual religioso, enquanto outras preferem, como em tempos idos, ficar em casa, à porta ou à janela, com uma vela acesa na mão.
Fonte Grande
Ainda no Ladoeiro, tinha lugar outrora, a «Procissão dos Nus», que se efectuou pela última vez em 1900. Ocorria, principalmente, na Quaresma, ou quando era necessário pedir a ajuda divina perante calamidades: secas, chuvas, pragas ou, simplesmente, para solicitar benesses para as terras de cultivo.
Os pais das crianças (só os homens) juntavam então os filhos com idades compreendidas entre os dois e os sete anos, meninos e meninas, na igreja matriz, despiam-nos e percorriam com eles, em procissão nocturna, as ruas da aldeia. O choro começava no interior da igreja, após ter sido retirada a roupa às crianças. Choro que aumentava ao saírem para a rua. Causas óbvias: o inesperado da situação, o frio, a vergonha e o medo.
Pelas ruas, o choro das crianças impressionava aflitivamente quem o ouvia. Os pais, esses, acreditavam ser essa a forma de Deus os atender. Daí, oferecerem-Lhe o sacrifício dos filhos. Várias razões os obrigavam a fazê-lo: a pobreza, a sobrevivência, a ingenuidade, a ignorância. E se Deus no seu infinito amor às crianças atendia o pedido dos pais, era por saber que os homens, afinal, O conheciam tão pouco, ao exigirem tamanha penitência dos filhos.
Soledade Martinho Costa
Do livro «Festas e Tradições Portuguesas», Vol.III
Ed. Círculo de Leitores
De
Lena a 26 de Março de 2010 às 11:43
Olá Soledade!
Por acaso, também há uma lenda que fala de uma Romaria dos Seminus em Castelo Mendo. Tem a ver com a interessante lenda do Monstro e do Ermitão, conhece? Muito interessante mesmo.
Do Ladoeiro, só conhecia o Festival da Melancia, produto exemio da região.
Jocas gordas
Lena
Aproveito e deixo um convite: participe na Blogagem de Abril do blogue www.aldeiadaminhavida.blogspot.com. O tema é: “Páscoa na minha Aldeia”. Basta enviar um texto máximo 25 linhas e 1 foto para aminhaldeia@sapo.pt (+ título e link do respectivo blog) até dia 8 de Abril. Participe. Haverá boa convivência e possíveis prémios (veja mais dia 29/03 no blog da Aldeia)!
Boa Páscoa!
De
sarrabal a 26 de Março de 2010 às 18:40
Olá, Lena!
Todos os vossos temas são interessantes. «Páscoa na minha aldeia», é outro, bastante aliciante. Mas, no que me diz respeito, seria desleal concorrer por duas razões. A primeira, porque não tenho aldeia; sou de Lisboa. A segunda, porque os textos que já escrevi sobre a Páscoa estão publicados na colecção «Festas e Tradições Portuguesas», além de os ir publicando aqui, no Sarrabal). Quase todos são longos e os posts que deixo no blog são já um resumo.
Fico satisfeita pelo seu sempre amável convite . E lá vou, fazendo uma visita ao seu blog, para estar a par do que por lá se vai passando. Grata também pela visita e feliz por lhe dar a conhecer algumas das tradições que se vão mantendo pelo nosso paìs.
Beijinho da Sol
De Ibel a 29 de Março de 2010 às 22:01
Fico sempre muito melancólica na época da quaresma. Há um Cristo que renasce num jardim das Oliveiras para ser entregue por Judas e que morre na cruz para salvar uma humanidade irremediavelmente doente. Para quê tanto sacrifício? Homem esplendoroso e único, merece que o relembremos no silêncio das nossas lágrimas .
Adoro estas tradições e a forma como as relata.
Beijinho, Sol.
De
sarrabal a 30 de Março de 2010 às 19:43
«Para quê tanto sacrifício?», diz a Ibel. É uma verdade: os homens parece que nada aprenderam. Resta a esperança de que o mundo um dia seja melhor.
Beijinho da Sol
De António Romeiro a 8 de Julho de 2014 às 12:12
Bom dia,
Interessante, mas gostaria de saber, se possível, donde retirou a informação.
Obrigado pela atenção.
António Romeiro
De
sarrabal a 3 de Setembro de 2014 às 12:57
As informações foram-me dadas por pessoas do Ladoeiro, por documentação fornecida pela Câmara Municipal de Idanha-a-Nova e pelo pároco. Grata por ter gostado.
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