Já em tempos, numa crónica publicada aqui, no blog, falei nas chamadas «inconveniências infantis» – que não deixam de ter a sua graça (quando recordadas à distância), muito embora, na altura, deixem os pais, principalmente, numa situação embaraçosa.
Mas, a verdade, é que também há uma outra espécie de «inconveniências» praticadas pelos próprios pais. Inconveniências ou incongruências, ou outro nome que lhe queiram chamar.
Sobre este assunto muito haveria a contar. Todavia, limitar-me-ei a relatar três casos, passados já há alguns anos. Quem escreve, como eu, costuma apontar umas linhas quando algum assunto lhe desperta a atenção. Se não se debruça logo sobre ele, alguma razão o impediu – mas não esquece o episódio e, mais tarde ou mais cedo, volta a ele, para recordá-lo num texto, geralmente, numa crónica. É o caso. Vamos, então, ao primeiro:
Numa das emissões da Televisão (não me recordo qual o canal), contou-se o facto de uma criança, um menino, necessitar de ser operado, por ter grande dificuldade em articular as palavras. Dificuldade que o tornava quase mudo. Depois da cirurgia, havia muitas hipóteses de vir a falar. Com essa intenção abriu-se uma conta e a solidariedade pública (anónima ou não) fez o resto. Os pais, pessoas de fracos recursos, não podiam suportar as despesas.
Mas eis que surge o impensável. Tempos depois, é anunciado pela TV (lembro-me de ter sido o pivot José Rodrigues dos Santos a dizê-lo), que os pais do menino «com o dinheiro angariado, destinado à operação, haviam decidido comprar um automóvel. À pergunta porquê tal decisão, terão respondido: «assim o menino distrai mais, não é verdade?»! Que tirem os leitores as suas conclusões (por mim, desisto!).
O outro caso, diferente, mas igualmente insólito, a que assisti pessoalmente, passou-se numa loja de bijutaria no Algarve. Um casal entra na loja. Ela: saia travada e curtíssima, sapatos de salto altíssimo, unhas longas e vermelhas, muita pintura, muitas pulseiras, muitos anéis, muitos colares. Ele: sapato de tacão alto, camisa estampada (tipo havaiana), aberta, a mostrar um grosso fio de ouro, vários anéis e uns óculos espelhados. Enfim, cada qual deve vestir-se conforme gosta. Mas este casal dava, realmente, nas vistas.
Ao serem atendidos pela solícita empregada, diz a mulher: «Sabe, eu procuro um colar de contas brancas e pretas para uma menina de oito anos. Se tiver pulseira a condizer, melhor!».
Saí da loja sem saber se havia ou não o colar e a pulseira de contas brancas e pretas para a tal criança. Mas fiquei a pensar nas minhas netas, ataviadas com um colar e uma pulseira assim – e fiquei absolutamente arrepiada…
O último episódio teve lugar numa pastelaria em Condeixa-a-Nova. Também aí estive presente.
À espera de ser atendida, reparei que um menino, aparentando uns quatro ou cinco anitos, comia um bolo com creme, perto da mãe. Lambuzado e com as mãozitas sujas, o que fazia a criança? Arredio de cerimónias, ia limpando as mãos ao casaco de um senhor que se encontrava à sua frente, sem que este desse por isso. Embora preocupada com o que via, achei que não devia interferir. Iria dar a impressão (sobretudo à criança) que estaria a acusar o menino. A certa altura, a «vítima», apercebendo-se, finalmente, de que estava a servir de guardanapo, alertou a mãe do pequenito, desatenta à diabrura inocente do filho. Com um à-vontade inacreditável, eis a sua resposta, breve e convicta: «Ah, isso limpa-se bem!».
A mim, não me pareceu. Agora o pedido de desculpa que se impunha, e a chamada de atenção para a criança, que nem se apercebeu do sucedido, esses ficaram «para o tempo das calendas gregas» – enquanto o dito senhor saía do estabelecimento, visivelmente incomodado, a pensar (mais do que certo!) que o pão que havia comprado lhe havia ficado caro - considerando o preço a pagar na lavandaria pela limpeza do casaco.
Soledade Martinho Costa
«Camões», Almada Negreiros
Se a vida nos ensina e nos constrói
Se ousados são os passos
Neste chão que pisamos sendo o nosso
Firme o apertar das mãos
Fraterna a canção que nos embala
Clara a voz nas preces que acendem clarões
Que o Sol aqueça o seu fulgor eterno
Que se vistam de cores as flores da Terra
Que se cale a pergunta que hoje faço:
Não chega já o espanto metralhado
A fome numa boca de criança
A seara esventrada
O ódio a crepitar na chama?
Se uma coisa de nada faz a guerra
Se a guerra é uma coisa abominada
Que crime imputará matar-se a guerra?
Soledade Martinho Costa
. ANIVERSÁRIO DA MORTE DE N...
. VARINAS
. VERSOS DIVERSOS - O CONSE...
. LEMBRAR ZECA AFONSO - 37 ...
. A VOZ DO VENTO CHAMA PELO...
. CARNAVAL OU ENTRUDO - ORI...
. REGRESSO
. 20 DE JANEIRO – SÃO SEBAS...
. UM OLHAR SOBRE A PAISAGEM...
. AS «JANEIRAS» E OS «REIS»...
. BLOGUES A VISITAR