Se a mágoa não sente pena/ nem carinho por ninguém/ agarra-se uma viola/ uma guitarra também/ solta-se a voz/ e num fado/ deixa-se a alma falar/ cantando/ as mágoas que tem.
SUGESTÃO: O que normalmente se propõe como obrigação para o outro fazer.
DISPARATE: Em cada frase que se ouve por aí – um quarteirão deles.
ESCÂNDALO: O que para uns pode ser e para outros não.
APLAUSO: Devem receber-se com humildade e não regatear quando se dão.
EXPECTATIVA: Cá estou, à espera.
PREOCUPAÇÃO: Quem não a tem é louco.
EMOÇÃO: Um dom de Deus.
AMOR: Já se disse tudo e ainda não se fez nem metade.
SAUDADE: Essa necessidade imperiosa de voltar a ver-te, muito sofrida.
SONHO: Um direito que nos assiste.
MEDO: Antigamente, quem o tinha comprava um cão.
INTIMIDADE: Há íntimos que não são amigos e amigos que não são íntimos.
FIGURA PÚBLICA MAIS: Alberto João Jardim.
FIGURA PÚBLICA MENOS: São mais de 100!
CALENDÁRIO: Parem-me esse malvado!
Autoria e coordenação: Soledade Martinho Costa
In Notícias Magazine/1999
N. – Desde sempre me habituei a ouvir e a gostar do jeito de cantar de Dom Vicente da Câmara. Em palco, tê-lo-ei visto umas duas vezes. Pessoalmente, conheci primeiro o filho, José da Câmara. Com o meu poema «Coradinha» (que escrevi a seu pedido, «uma coisinha simples»), canta ele um fado, que musicou, no CD «Noitadas». O facto de ter conhecido depois pessoalmente o pai conta-se assim:
Andava eu no Príncipe Real à procura de um candeeiro de mesa, dando uma volta pelos antiquários, quando entro num deles, onde um empregado de avançada idade e de uma amabilidade extrema me atendeu. Ao precisar de um esclarecimento, foi pedi-lo ao «patrão». E eis que me aparece, por entre móveis antigos e objectos raros, aquele homem alto, muito alto, de cabelo grisalho e sorriso aberto. Exactamente! Tinha na minha frente Dom Vicente da Câmara! Daí a pouco, esquecido de momento o candeeiro, falávamos do filho: «o fado com a minha letra estava bonito, o Zé tinha habilidade para a música, que gostava dos meus poemas» … Não foi preciso mais. Convidou-me a segui-lo na loja, e a entrar lá atrás, onde tinha um pequeno escritório, muito bem escondido. E passámos tempos a conversar. Contou-me quantos netos tinha (nessa altura já eram tantos!) e um segredo: escrevia para crianças – o que não era, de todo, de admirar. Ao corrente de que eu própria tinha obra para os mais pequenos, pediu-me para dar «uma olhadela» ao seu último livro, pronto a editar. As ilustrações estavam já prontas também. E foi assim que voltei à sua loja, para devolver-lhe o original e dar-lhe os meus parabéns. Tal como para o fado, não lhe faltava jeito para ser escritor. Ficámos amigos. Uma vez por outra falávamos pelo telefone – coisa que já não acontece há uns tempos. Daí, o convite para representar o Fado neste questionário. Vejo e falo mais vezes com o José da Câmara – que, entretanto, já lhe deu três netos. Actualmente, Dom Vicente da Câmara tem 18 netos: 9 rapazes e 9 raparigas.
Obrigada aos dois, principalmente a si, Vicente da Câmara, pela sua voz, que continua a ser inconfundível neste País onde, apear de tudo, fadistas é coisa que não falta. E, já agora, o candeeiro continua no lugar que lhe pertence, sempre lindo e olhado com muito amor (o meu!).
Abraço amigo de quem vos admira como artistas, como pessoas – e como Família!
S. M. C.
Andei hoje a passear um pouco pelo Facebook. Coisa que faço poucas vezes. Por sorte – ou não – dei de caras com este texto. E não resisti à tentação de publicá-lo no Sarrabal. Para quem não leu. Ou para voltar a ser lido. Por esta leitura poderemos aquilatar o respeito, a harmonia, a amizade, o companheirismo que (des)une os escritores portugueses. E isto porquê? Respondam os leitores. São tantos, mas tantos os adjectivos… É só escolher!
S.M.C.
ESTRADA DO ALICERCE
Ao ver, há poucas semanas, um texto de José Saramago no enunciado da prova final de Língua Portuguesa de 6º ano, recordei um saboroso e muito vertical artigo do filósofo e poeta Paulo Tunhas sobre um ensaio de João Pedro George em torno dos livros de Margarida Rebelo Pinto (p. 43 do nº 14 da revista Atlântico). A dada altura, afirma (e com razão, a meu ver):
“[...] Cheguei à conclusão que Saramago é um mau escritor talentoso, uma espécie vulgar. Palavroso, moralista, sem ponta de ironia. Uma opinião, apesar de tudo, ligeiramente melhor do que aquela para a qual, na minha ignorância, eu tendia naturalmente. Leva-se suficientemente a sério para não se entediar a meio da escrita dos livros, e isso permite-lhe um certo élan, naturalmente interdito a espíritos mais voláteis ou simplesmente mais lúcidos.”
Como a memória tem coisas que ninguém entende, enquanto lia estas frases recordei uma crónica do crítico e ensaísta Fernando Venâncio, onde – delicada e ironicamente – punha a nu os espanholismos desnecessários que enxameiam as obras do romancista, não como recursos estilísticos, o que seria normal, mas como pés que resvalam para a poça, como descuidos que um bom revisor nunca deveria permitir.
Sobre o homem-Saramago reencontrei ainda um artigo de José do Carmo Francisco intitulado: “Será José Saramago um fotógrafo de Estaline? (Crónica para os olhos tristes de Maria Belmira)”, vindo a lume no nº 29 de suplemento Fanal do jornal O Distrito de Portalegre (22/11/2002):
“[...] O mesmo José Saramago que um dia recebeu um enormíssimo ramo de flores numa homenagem promovida por uma Câmara Municipal no Alentejo e não quis voltar para Lisboa sem primeiro passar pelo Lavre para entregar o ramo à tua mãe para que o destino final daquelas flores fosse a campa do teu irmão João, foi o mesmo que resolveu apagar o nome do teu pai, da tua mãe, da tua irmã e de várias muitas outras pessoas da primeira página do livro Levantado do Chão. E isto mesmo depois de ter assegurado por escrito e por extenso – Sem eles não teria sido escrito este livro.
[...] [Este texto] é no fundo um texto de descoberta, de revolta e de repúdio por uma situação de morte civil só comparável à acção dos fotógrafos de Estaline que faziam desaparecer das fotografias várias pessoas inconvenientes e que, só anos depois se viria a saber, não deveriam ter estado ao lado do ‘grande líder’. [...]
[...] [Isto] para ir lembrar o ano de 1976 quando tinhas apenas quinze anos de idade e um escritor quase desconhecido entrou pela porta da casa dos teus pais para escrever um livro (Levantado do Chão) e para, muitos anos depois, de modo totalmente inesperado e (para mim) injusto, vir fechar a primeira página desse livro a quem lhe tinha aberto as portas da sua casa e do seu coração.”
A pouco e pouco o pano vai caindo. E, não fossem influências de várias ordem – que nada têm que ver com a arte e a literatura, mas com manobras relacionadas com dinheiro e com jogos políticos e pessoais –, mais cairia ainda… Há cada vez mais homens e mulheres que concordam com as palavras do poeta polaco C. Milosz (galardoado justamente com o prémio Nobel). No momento em que Saramago recebia a distinção sueca, não teve papas na língua e quebrou o unanimismo acrítico, afirmando que o autor de Memorial do Convento não passava de “um escritor de segunda ordem”. Fosse o grande escritor polaco português e chamar-lhe-ia, talvez, com Paulo Tunhas, “um mau escritor talentoso”. Eu encontraria outros adjectivos, mas aqueles que se apresentam são suficientes para qualificar quem viveu e quem escreveu naquele ser humano.
Ser famoso, como se deveria saber, é bem diferente de ser importante. E não basta receber o prémio que mais dinheiro oferece para se ser um escritor, um artista, inovador e um ser humano exemplar. Como diz um velho provérbio, nem tudo o que luz é oiro – e às vezes nem prata é.
Ruy Ventura
Nota – O texto (quanto a mim, vergonhoso!) não foi retirado da página de Ruy Ventura no Facebook. Mas de uma outra, pertencente a José do Carmo Francisco, um dos «componentes» do respectivo texto. Num caso como este não devem ocultar-se nomes. Embora o post tenha sido publicado, inicialmente, no blogue que Ruy Ventura administrava, «ESTRADA DO ALICERCE» (que não sei se ainda está activo).
Por acaso, haverá por aí alguém que se queira juntar a este grupo de lata (e com lata!), que só mostra, sem pudor, o seu recalque, a sua inveja, o seu maldizer em relação ao nosso NOBEL?
Soledade Martinho Costa
Poema incompleto
É a palavra
Que à falta do cristal que se procura
Se fecha por dizer
Dentro da alma
E morde, esbraceja, amordaçada.
É a pedrada
Que se acobarda na mão de quem a sente
A fingir que a dor recusa o pranto
E adormece na carne estranhamente.
Poema incompleto
É a fogueira
Que espalha o fumo e a cinza pelo espaço
A desenhar promessas proibidas
Em tempo que se atrasa e que nos foge
Sem que nos roube o sonho e a teimosia.
É a muralha
A separar-nos da voz da consciência
Fúria de mar de limos e maresia
Bala perdida no meio da contenda
Que por temor de si nos trás cativos.
Poema incompleto
É a coragem
De morrer mil vezes
Estando vivos.
Soledade Martinho Costa
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