Segunda-feira, 28 de Julho de 2008
Salão Nobre ou Sala dos Espelhos, Palácio Foz, Lisboa.
Era uma vez uma borboleta que convidou um menino chamado João a ir ao seu palácio. Quando o João chegou ao palácio ele ficou maravilhado. Era cor-de-rosa muito clarinho, era quase branco. O palácio estava escondido entre oliveiras, pinheiros, eucaliptos e todo o tipo de flores: rosas, margaridas, girassóis e muito mais; e nessas plantas dançavam gotas de orvalho acompanhando a melodia do vento. O palácio tinha 7 torres para além do centro. O João tocou à campainha e uma voz doce respondeu:
- Olá meu amigo João.
- Olá borboleta.
O palácio ainda era mais lindo por dentro. A porta era de madeira com uma maçaneta dourada. O chão era liso e cor-de-laranja. Ela explicou-lhe que o centro era uma enorme sala onde ela descansava no seu sofá vermelho e confortável a ver televisão ou a ler. A borboleta também lhe explicou que para um lado do centro haviam 4 torres e para o outro 3. A biblioteca foi a primeira torre. Era toda de cortiça e tinha milhares de livros. A segunda torre era a cozinha. Era em prata e em ouro, com panelas e tachos nos armários. A terceira torre era a garagem. Onde ela guardava o seu Rolls Roice. A garagem era branca e preta no chão e na parede. A quarta torre era a sala de jantar onde tudo era branco menos a mesa que era de cristais de várias cores. Depois subiram escadas de pedra e foram para o quarto dos filhos da borboleta: o Seky e o Suky. Era verde e vermelho e uma cama era de ouro e outra era de prata. Depois foram ver a casa de banho. A banheira era de ouro, era tão perfumada como o cheiro das rosas. O chão era aos mosaicos brancos. Por fim, foram ver a torre mais alta: o quarto da borboleta. Era o chão cor-de-rosa e a parede da cor do arco-íris e a sua cama era de seda. Assim acabou a visita ao palácio da borboleta.
Rafael, o escritor (9 anos) – texto não corrigido.
Sábado, 26 de Julho de 2008
Foi no cais de Belém
Pelo mês de Julho
Que o Tejo
Se enfeitou de caravelas.
De naus anunciando
Ao sal das ondas
Uma rota de fé e ousadia
A cumprir-se no frio de Novembro.
E foi nas verdes águas que calaram
Saudades de um País nunca esquecido.
E foi nas verdes águas que deixaram
O destemor, a raça, a própria vida.
E foi nas verdes águas que tocaram
O pranto nas guitarras aprendido.
Aqueles que tão longe
Transportaram
Sinais de um povo luso
Marinheiro:
Angediva
Melinde
Calecute
Num tempo de glória acontecido.
Soledade Martinho Costa
Quarta-feira, 23 de Julho de 2008
É verdade. Já passou um ano desde que coloquei o meu primeiro post no Sarrabal. Daí, os parabéns pelo seu primeiro aniversário. Duplo, devo dizê-lo, como irei explicar um pouco mais à frente.
Devo agradecer à equipa técnica do Sapo, ter chegado até aqui com alguns conhecimentos sobre o funcionamento dos blogs – embora continue a aprender. Todos têm sido de uma simpatia notável. Fica outro agradecimento à SiteMeter, pela prontidão em resolver pequenos problemas que são do seu âmbito. Excelente trabalho.
Por falar no contador do SiteMeter, devo dizer também que foi colocado no Sarrabal há perto de cinco meses. Não sei avaliar se é ou não positiva a contagem (ou, mesmo, se será fiável). Aqui ficam os números exactos até ao dia de hoje:
Visitantes: 4.252
Páginas lidas: 7.311
Ignoro o que se passa com os outros blogs. Se calhar, os meus números são reduzidos. Se calhar, não são. A questão é que não sei, nem estou interessada em saber. Para mim, o que verdadeiramente importa, é que tenho leitores e muitos deles leitores fiéis. Tão fiéis que, alguns, chegam ao ponto de visitar o Sarrabal diariamente – por vezes mais do que uma vez ao dia. O que me deixa absolutamente rendida e grata. É possível que muitos destes leitores não saibam como se obtêm tais conhecimentos. Mas o contador faz milagres! Evidentemente, que não conheço os visitantes (era melhor!), mas fica registado o nome das localidades onde residem. São essas localidades, algumas com nomes fora do comum, que fazem com que as decore facilmente.
De um modo geral, isto é, de Norte a Sul é Portugal que vem até às palavras que escrevo, incluindo a Madeira e os Açores. Não são pródigos nos comentários. Isso não. Os portugueses são reservados. Outras vezes, não sabem como devem fazê-lo. Para muitos, não parece tarefa fácil comentar os posts. Mas, na maioria, vêm só para ler. E espanto-me, ainda, quando os visitantes ficam a ler mais de duas horas seguidas bem contadinhas! Outros, cinco minutos chegam para a leitura, ou até menos. Há também quem faça a leitura com intervalos. Bom, e há aqueles que, sendo focados nos posts, agradecem pelo telefone. E os outros, os que contactam por email. Uns e outros sem fazerem comentários no blogue! Aqui fica a minha gratidão para todos eles. Principalmente, para os que me têm deixado escritas (ou dito) palavras simpáticas, enaltecendo o meu trabalho. Amigos, faço o melhor que sei!
Depois, outro espanto (nem falo nos visitantes do Brasil, quase tantos como os portugueses!). Falo dos visitantes que chegam ao Sarrabal vindos dos quatro cantos do Mundo (obrigada SiteMeter!): Argentina, Alemanha, Áustria, Bélgica, Canadá, China, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, França, Grécia, Holanda, Inglaterra, Islândia, Itália, Indonésia, Japão, Luxemburgo, Luanda, Moçambique, México, Noruega, Suiça, Suécia, Tailândia, Kénia e Venezuela, entre outros países.
E pronto. Vamos lá, então, partir o bolo e cantar os parabéns!
Soledade Martinho Costa
OUTRO ANIVERSÁRIO
Foi no dia 23 de Julho de 2007 que coloquei aqui, no Sarrabal, o primeiro post a lembrar que esta era a data do aniversário de Amália Rodrigues.Se fosse viva, Amália completaria hoje 88 anos.
Falar de saudades, da sua voz, da sua humanidade, da sua simplicidade, creio que será repetir o que todos os portugueses sabem de cor. Dizer que Amália era uma mulher extraordinariamente inteligente, sensível, culta, a grande Embaixatriz do Fado no estrangeiro – lugar que nunca lhe será usurpado –, também não merece a pena; todos nós sabemos isso. Enaltecê-la como Poetisa, como Mulher e Figura Pública muito amada, nada vai adiantar.
Tenho nas minhas mãos uma fotografia que Amália me ofereceu uma noite em sua casa. Nela escreveu estas palavras: «Para uma romântica, de outra romântica e solitária – Amália».
Não me perguntem porque razão Amália teimava em achar-me romântica. Talvez fosse pela forma de falar. De pensar e de acreditar nos outros. Sim. Talvez fosse por isso.
O que fica da dedicatória é a outra palavra, a mais importante e significativa: «solitária». Era assim que Amália se sentia. Muito mais solitária, certamente, se sentiria no dia de hoje, se fosse viva.
Repito o que escrevi há um ano atrás (juntando um novo poema):
Para si, Amália, fica o poema que lhe dedico neste dia.
Com a admiração, a saudade e a amizade de sempre.
ATÉ AO FIM DE MIM
Guitarra Portuguesa
De corpo e alma
Estou na tua frente
De corpo e alma e tua
Eis-me aqui.
Mas sem trazer comigo
Das palavras
As que te conte
As vezes que morri.
De corpo e alma
Estou na tua frente
À espera de te ouvir
Dizer porquê.
A razão desta mágoa
Deste canto
Desta voz que me deste
E reparti.
Que foi pela tua mão
Eu sei que foi
Que a vida me escolheu
E me mostrou
Uma estrada onde o fado
A mim prendi
Na solidão do meu nome
E de quem sou
Com franjas de mistério
E de destino
No xaile todo negro
Que vesti.
De corpo e alma
Estou na tua frente
A oferecer-te os meus passos
Já cansados
Que não de sonhos
Nem de fé em ti.
De corpo e alma e tua
Eis-me aqui
À espera do que diga
E do que faça;
Ser eu inteira
Até ao fim de mim.
Soledade Martinho Costa
Sábado, 19 de Julho de 2008
Na empena da casa, enquanto a tarde avança, a roseira-rubra abre o veludo de um botão numa rosa vermelha.
- A quem ofereces tu essa rosa, acabada de abrir? – Pergunta-lhe uma borboleta-do-brejo, a bailar nas suas quatro asas.
- Ao teu olhar, que reteve a beleza de a descobrir! – Responde a roseira-mãe, no perfume que lhe veste a folhagem.
Soledade Martinho Costa
Do livro "Histórias que a Primavera me Contou"
Ed. Publicações Europa-América
Quarta-feira, 16 de Julho de 2008
Apetecia-me dizer-te
Que penso em ti demasiadas vezes
Embora
Não as vezes necessárias.
A distância que nos separa
Deixou de ter qualquer significado;
Sempre que desejo
Corro a ver-te.
Conheço-te
Desconhecendo a cor dos teus olhos
Entendo as tuas palavras
Sem falar a tua fala
A tua angústia
Corre nas minhas veias
Os passos que escutas nos teus ouvidos
Soam atrás da minha porta.
A tua solidão
É a minha solidão inundada de Sol
No meio de risos
Os teus temores
Os meus temores nas alvoradas
Dos dias sem história
Os teus sonhos
Os meus sonhos sem freio
Esclarecidos.
As tuas chagas
Os teus gritos
A minha impotência
A minha ânsia
De poder dizer-te:
Estou contigo.
Sim, contigo
Olhando pela mesma janela
A mesma nesga de segredo
Contigo
A comer a mesma côdea de pão
Que mata a tua fome.
A dormir o mesmo receio
Nas horas que deslizam
Orladas de suor
Pela sujidade engordurada das paredes.
Contigo
A tecer as mesmas madrugadas prisioneiras
Abraçada ao mesmo destemor
E ao mesmo perigo.
Apetecia-me dizer-te
Que penso em ti demasiadas vezes
Embora
Não as vezes necessárias.
Soledade Martinho Costa
Do livro "A Palavra Nua"
Ed. Vela Branca
Sábado, 12 de Julho de 2008
A febre apareceu durante a noite. Caso sempre preocupante, principalmente, quando se trata de uma criança e a pediatra assistente se encontra de férias. Daí, a ideia de recorrer aos Serviços de Pediatria do Hospital de Vila Franca de Xira. A menina reside no concelho e o Centro de Saúde (como todos os outros) não tem pediatra.
Atendida no dia 16 de Maio passado pela médica Rosa Joaquim, foi pedida por esta clínica uma ecografia às vias urinárias (bexiga e rins) e análises (muito completas) ao sangue, à urina e às fezes. A medicação, uma vez que teria de se aguardar o resultado dos exames, resumiu-se a supositórios para a febre. A segunda consulta ficou marcada para o dia 11 de Junho, embora os respectivos exames tivessem ficado prontos antes do final de Maio. Feitas as contas, a criança teria de aguardar mais de 15 dias para apresentar os exames e voltar a ser vista pela pediatra.
Até aqui, que remédio! Frase que se encaixa, adequadamente, nesta crónica. O pior veio depois. Perto do dia 11, tão ansiosamente aguardado (as dúvidas, quando se trata, sobretudo, da saúde de uma criança, teimam em aflorar ao nosso pensamento e a menina continuava a não estar bem), recebe a mãe uma carta, enviada pelo referido Hospital, a adiar a consulta do dia 11 de Junho para… o dia 23 de Julho! - «Só para mostrar uns exames, ainda por cima de uma criança que teve consulta a 16 de Maio!?» – Pensei.
E porque o assunto me tocava de perto, resolvi telefonar para o Hospital de Vila Franca de Xira, convencida que a pediatra Rosa Joaquim não ficaria indiferente aos meus argumentos. Mas ficou. Com este adiamento, se ficasse em casa, a menina, estando de férias escolares, perdia, praticamente, um mês de praia no Algarve. Depois, acrescia o caso de se ignorar o resultado, exacto, do seu estado de saúde. Por outro lado, se fosse para o Algarve teria, no dia 23 do mês em curso, de fazer perto de 600 quilómetros para mostrar, apenas, os resultados dos exames!
Perante a defesa do meu ponto de vista, a resposta veio, tão antipática e ridícula como descabida: «Eu estive de férias!». Respondi: «Sim, doutora, mas já não está!». E dei comigo a pensar que seria difícil convencer esta mulher – que trata de crianças num hospital – a mudar de opinião.
Qual seria a ideia? Esta (que deveria ter saído da boca da médica): «Os pais da menina que dêem um salto até aqui para eu ver os exames». Assim, humana, solidária e profissionalmente dentro dos parâmetros exigidos a quem trata da saúde pública, sobretudo da saúde das crianças. Quanto muito, os pais demorariam pouco mais de 10 minutos a chegar ao Hospital de Vila Franca. Meus senhores, quem faz os hospitais são as leis, é o Estado, é o ministro da Saúde, mas quem faz parecer os hospitais muito da miséria que são, é também a maioria dos médicos sem brio nem respeito pela bata que vestem. Sem coração, diria. Caso desta senhora.
E outra resposta, tão “gentil” como as anteriores, surgiu, ditada pela médica em causa: «Ela que vá de férias no mês de Julho e de Agosto. Que esteja no Algarve o tempo que quiser. Quando voltar que venha ter comigo.»
Ao ouvir estas palavras empedernidas, ostensivas, trocistas, desprovidas, mesmo, de responsabilidade ética e profissional, qualquer pessoa ficaria indignada. Eu fiquei. Demonstrei-lhe a minha crítica à sua actuação. Resultado: com o maior à-vontade sugeriu-me, a denotar, claramente, que sabia o que estava a dizer: - «Não quer fazer queixa à administração do hospital?».
Argumentei que me tinha dado uma excelente ideia. Na minha ingenuidade, confesso, pensei errado, mais uma vez. Depois é que vi como as coisas estão bem orquestradas no Hospital de Vila Franca de Xira. Como algumas pessoas (exemplo desta médica) sabem que podem ficar impunes perante as atitudes que tomam, muito pouco edificantes para a classe médica. Ela bem sabia o que me estava a sugerir. Oh, se sabia!
Quando num outro telefonema a respectiva funcionária me atendeu, pedi para falar com alguém da administração do hospital. Resposta: «Não há administração. Há vários directores.» - «Nesse caso, qualquer um serve» – Respondi. E logo surge o esclarecimento que, na minha boa-fé, pensei que não entrava nesta crónica: «Lamento, mas estão todos em reunião.» - Argumentei: «E vão levar toda a manhã?». – Nova resposta na pontinha da língua: «É provável.»
Jogo por jogo, joguei: «E da parte da tarde, a reunião irá continuar?». Outra informação “cordial”: «É natural». Insisti, tentando saltar o muro que isola os senhores directores do Hospital de Vila Franca de Xira de tomarem conhecimento de qualquer caso que os incomode: «E amanhã, naturalmente, vão continuar em reunião?». Resposta seca e conclusiva: «É bem possível, minha senhora». Mesmo assim – mandam as boas maneiras – agradeci e desliguei. A funcionária cumpre instruções. E tem o “recado” muito bem sabido. Sempre é funcionária dos senhores directores, temos de admitir! E as ordens dos senhores directores, não se discutem. Cumprem-se.
Agora digam-me lá, se a dra. Rosa Joaquim não sabia, exactamente, o que me aguardava quando me mandou «queixar-me à administração»?
Falta dizer que a menina veio de imediato para o Algarve, onde os exames foram vistos por um médico pediatra. Está medicada, mas não havia nada de grande cuidado. Ainda assim, terá de fazer novos exames. Foi aqui, principalmente, que a pediatra do Hospital de Vila Franca de Xira pôs em causa a saúde de uma criança, preferindo arriscar.
Fiz-lhe a vontade (e a minha) ao escrever estas linhas, cara doutora Rosa Joaquim. Resta saber se gostou do retrato escrito que lhe fiz. É todo seu. E de corpo inteiro.
Soledade Martinho Costa
Quinta-feira, 10 de Julho de 2008
José Cid
Vestiram as estrelas
No céu negros mantos
Nos pinhais a dança
Das sombras cessou
E as ondas do mar
Rolaram seus prantos
No escuro da noite
O frio gelou.
Coimbra tremeu
E Pedro ficou
Tão cego de dor
Que logo a vingança
Em seu peito ardeu
A falar mais alto
Que o temor a Deus.
Que o temor a Deus.
À sua presença
Vieram então
Os homens que a vida
A Inês roubaram
Que a pressa de Pedro
Em fazer justiça
Pela morte da amada
O gesto o ditou.
E verdade ou não
No eco das vozes
Assim se contou:
Em ambas as mãos
Arrancado ao peito
De um dos três algozes
O seu coração com raiva trincou.
E mais se contou:
Que mesmo já fria
D. Pedro sentou
Dona Inês no trono
E nele a coroou
Rainha e Senhora
E o reino com ele
Sua mão beijou.
E o reino com ele
Sua mão beijou.
Letra: Soledade Martinho Costa
Música: José Cid
Interpretação: José Cid e Vitor Sá (Fado de Coimbra cantado a duas vozes)
Para assinalar os 650 anos sobre o aniversário da morte de Inês de Castro (7 de Janeiro de 1355).
Túmulo de D. Pedro I, Mosteiro de Alcobaça
Segunda-feira, 7 de Julho de 2008
Mais uma vez vou falar da Teresinha. Das “coisas” da Teresinha.
Já referi aqui dois dos termos por ela usados frequentemente: «vou mostrar-me ao espelho» em vez de «vou ver-me ao espelho», e a palavra «atchingar», a substituir o vocábulo «espirrar».
A Teresinha possui uma certa propensão para inventar palavras. Só ainda não sabe que se trata de neologismos, porque ninguém lhe disse e eu não tive ainda a oportunidade de lhe explicar.
Desde que começou a falar com mais desenvoltura, começaram também a surgir no seu vocabulário palavras novas, que foram motivo de surpresa e graça para toda a família. Por brincadeira, até costumamos imitar essas palavras: «Já atchinguei!», é uma delas.
Mas, há mais. Quando todos dizemos «lamber» – são pouquíssimos os sinónimos para esta palavra e nem todos condizentes – a Teresinha, desde muito cedo, optou por dizer «linguar». Ora, «linguar», quanto a mim, tem muito mais sentido, porque deriva da palavra «língua», enquanto o vocábulo «lamber», embora nos indique que a nossa língua percorre alguma coisa passando sobre ela, não me parece tão conseguida no aspecto linguístico. Temos que dar razão e mérito à «inovação» da Teresinha.
- Teresa, olha… – Chama o irmão.
- Agora não posso. Estou a «linguar» a colher do mel!
- Mãe, posso «linguar» o chocolate do bolo?
- Gosto tanto de «linguar» este “nogat”!
Isto, para não falar nos crepes. «Linguar» o prato depois de ter comido o crepe, não sendo uma coisa elegante nem bonita de se fazer, é o remate para dar por terminada uma “operação” a todos os níveis capaz de absorver a Teresinha por largos minutos. O prato fica limpo como se tivesse saído da máquina de lavar loiça!
Mas a Teresinha não é uma menina gulosa. Raramente pede um bolo. Rebuçados também não, «fazem mal aos dentes, e o açúcar não é nada bom para a saúde», e não gosta de arroz-doce. – Ao contrário do irmão, que não aprecia doces, mas não dispensa a tacinha de arroz-doce, em casa ou no restaurante.
A Teresinha gosta, isso sim, de toda a espécie de frutos: «Esta saladinha de fruta está uma delícia!». E gosta de nozes e amêndoas, mas, principalmente, de pinhões.
Voltando aos doces, há uma coisa que a Teresinha «lingua» primorosamente bem: são os gelados. Quando está a «linguar» um gelado não há nada nem ninguém que a faça distrair dessa função gustativa, tão fresca e tão do seu agrado.
Como o acordo ortográfico parece ter ido mesmo por diante – o que, sinceramente, lamento –, vou propor a introdução dos neologismos da Teresinha nos novos dicionários de Língua Portuguesa. Os “inovadores” são bem capazes de aceitar. Não tenho qualquer dúvida quanto a isso!
Soledade Martinho Costa
Quarta-feira, 2 de Julho de 2008
Amêndoas, dentro da «casca de fora».
Castrados de seiva
Esquecidos de outros silêncios
E outros passos
Guardar
Na memória dos olhos
Os cerros
Incendiados
No calor de Julho:
O avatar do tempo
Que dorme
Ao Sol
No dorso dos lagartos.
Das copas
O verde das figueiras
Num beijo de sombra
Pelo chão.
A terra
Labirinto de gretas
Em agonias de sede
Sob a coroa rubra das romãs.
De veludo
Gémeos
Os frutos
Na folhagem das amendoeiras.
Invisível
O canto das cigarras
No sortilégio mouro
Das manhãs.
Soledade Martinho Costa
Do livro “15 Poemas do Sol e da Cal”
Ed. Editorial Presença
Terça-feira, 1 de Julho de 2008
Camarinhas
Leva a gula
O javali
À horta
E ao pomar.
Julho respira aromas
A esteva e alfazema
De branco as camarinhas
São noivas dos pinhais.
O Sol
Seduz a terra
Em abraços de chama
Acendem pirilampos
Lanternas de luar.
Soledade Martinho Costa